Corte em orçamento da ciência e tecnologia preocupa entidades científicas
Reportagem: Marquezan Araújo/ Agência do Rádio Mais
Os cortes no orçamento federal de ciência e tecnologia, que tem sido recorrentes nos últimos anos, são motivo de preocupação recorrente para entidades científicas e de ensino superior do país. Este ano, o contingenciamento chega a R$ 29,6 bilhões no orçamento federal, o que traz imprevisibilidade para pesquisa e desenvolvimento científico.
Um projeto de lei em tramitação no Senado Federal pode evitar, ao menos em parte, o corte de recursos destinados à ciência e tecnologia. O PLS 315/2017, de autoria do senador Otto Alencar (PSD-BA), impede o governo federal de bloquear no Orçamento despesas relativas à inovação e ao desenvolvimento científico custeadas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (FNDCT).
De acordo com o MCTIC, esse fundo tem como fonte de receita os incentivos fiscais, empréstimos de instituições financeiras e contribuições e doações de entidades públicas e privadas. Criado em 1989, o FNDCT é executado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e é um importante instrumento financeiro de integração da ciência e tecnologia.
Assim, embora não impeça o bloqueio de recursos do MCTIC como um todo, a aprovação desse projeto pode garantir a manutenção de verbas para a área. Para se ter ideia da importância desse fundo, em dezembro de 2018, a Finep divulgou que atingiu uma meta de 99,6% de empenho de recursos do FNDCT naquele ano.
Ao todo, a financiadora comprometeu R$ 953,2 milhões dos R$ 953,6 milhões do orçamento previsto para 2018. O empenho é uma autorização para que essas despesas sejam executadas e pagas após a sua conclusão.
“A ciência e a tecnologia, nos últimos anos quatro anos, ficaram completamente abandonadas e o Brasil não pode avançar sem ciência e tecnologia, sem investir na boa cabeça, na boa inteligência daqueles que querem trabalhar nesse sentido”, afirma o senador Otto Alencar, autor do projeto.
Bloqueio ineficiente
Na apresentação do projeto, Alencar afirma que o bloqueio de recursos do fundo é feito de forma ineficiente, “pois não leva em conta o impacto de determinados gastos sobre o crescimento econômico futuro do país e, por consequência, sobre a sustentabilidade do próprio ajuste fiscal em curso”.
Além de vedar o contingenciamento de recursos, o projeto muda também a natureza do fundo, que passa de contábil para financeira. Essa mudança contribui justamente para impedir o bloqueio desses recursos, além de permitir a sua aplicação no sistema financeiro.
A proposta também aumenta de 25% para até 50% o percentual de recursos orçamentários a serem emprestados pelo fundo à Finep para a aplicação em projetos de desenvolvimento tecnológico de empresas.
Atualmente, o texto está sob análise dos senadores na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Caso seja aprovada, a matéria ainda deve passar pelo crivo do Plenário do Senado, antes de seguir para a Câmara dos Deputados.
Entidades mostram preocupação
Entidades científicas e do setor de educação divulgaram nota afirmando que, se as restrições orçamentárias não forem corrigidas a tempo, serão necessárias décadas para reconstruir a capacidade cientifica e de inovação do país.
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) recebe dinheiro do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Segundo o presidente da instituição, João Luiz Filgueiras de Azevedo, para 2019, o valor destinado ao conselho foi de R$ 900 milhões, mas que o valor mínimo que o órgão precisa para manter os projetos de pesquisa e honrar os compromissos já assumidos com bolsas é R$ 1,2 bilhão, o que gera um déficit de R$ 300 milhões.
Uma das instituições prejudicadas com a redução do orçamento do CNPq para este ano é a Universidade Estadual de Londrina (UEL). De acordo com o vice-reitor Décio Sabbatini Barbosa, “45% das bolsas são para área de iniciação científica e tecnológica”. “Do CNPq, são 348 bolsas. Com esse corte, essas bolsas não vão estar garantidas”, afirma.
Ainda segundo Sabbatini, a UEL tem 129 bolsistas de produtividade que podem ficar sem o benefício em função desse corte. “Esses bolsistas de produtividade são profissionais de altíssimo gabarito. Eles foram contemplados com essas bolsas porque houve uma seleção, então são pessoas que produzem pesquisas de ponta”, lembrou.
Reserva de contingenciamento
Entre 2016 e 2018, o valor da reserva de contingência do FNDCT ultrapassou R$ 5,3 bilhões. Essa quantia dever ser utilizada apenas em casos de emergência. A reserva fica bloqueada e só pode ser liberada por meio de decreto presidencial.
De acordo com o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, a reserva de contingência aplicada aos recursos do FNDCT vai provocar um cenário de restrição orçamentária do Fundo.
Para o MCTIC, essa medida gera um impacto significativo nos recursos destinados à “execução de projetos em andamento, comprometendo o planejamento de longo prazo, ao limitar a disponibilidade para proposição de novas ações de pesquisa e desenvolvimento.”